10 agosto 2016

Vamos falar (viver) de amores ridículos?

Coldplay Maracanã-RJ 2016

Q

uando mais nova, eu não era de fazer grandes planos para o “juntos para sempre” como se imagina que o tenha sonhado as pessoas do vídeo. Um amor pelo qual cruzar grades e subir palcos. Um amor pelo qual gritar para milhões de pessoas e aguardar ansiosamente que apenas uma delas escute. Primeiro, porque o verso “o pra sempre sempre acaba”, na voz de Cássia Eller, sempre martelava a minha cabeça como um tapa na cara e sem o menor rodeio. Segundo, porque as minhas atenções, naquele tempo, não se voltavam a nada além de passatempos adolescentes ridículos. Sim, ridículos, como diria Fernando Pessoa. O amor é ridículo e, se assim não o for, ridículo, não é amor. Mas, pra ser bem honesta, eu não poderia ser tão ridiculamente romântica convivendo com o surrealismo amoroso da minha amiga-irmã e o seu país das maravilhas. Alguém de nós duas precisava ter os pés no mundo real e esse alguém, definitivamente, não era ela. Ela me adoçou com seu romantismo e eu a protegi com o meu bom-senso. 

Era daí que vinha o meu gosto pela ideia de que aquilo que somos nada mais era do que a soma das pequenas doses de vida que cada encontro nos proporcionava ao longo do tempo. Seja com a natureza, com os objetos, com os seres. Sejam eles simpáticos, antipáticos ou apáticos. Todos os encontros, sem exceção, seguem a lei natural cantada pelos Novos Baianos e dão-nos a possibilidade de se deixar e receber um tanto. De forma que, quando já se deixara e recebera um tanto suficientemente razoável (e aqui abro um parêntese: por favor, não tente quantificar ou limitar isso), supõe-se que em um desses encontros, você encontre o seu eu daquele instante no outro, sem capas ou maquiagem, e queira juntar tudo numa coisa só.

E foi assim, quando não queria procurar, que eu encontrei e quis duvidar. Na época, o Los Hermanos me fazia pensar que era muito clichê para ser. Eu sempre gostei de contrariar. Mas, o fato é que eu me via no riso fácil, nos olhos acastanhados, na cor do sol, no jeito otimista de enxergar o mundo, nos sons gaguejados, na segurança dos passos. Com ele, eu conseguia ver o melhor e o pior de mim. Eu o encontrei, digo, eu me encontrei nele, de maneira que ele passou a ocupar em mim um lugar, pelo qual não se entra em negociação, um lugar que é só dele, independente do que haveria de acontecer com nós dois.

E o que haveria de acontecer que não fosse o amor na sua forma mais honesta? A garota que outrora tentava não ser tão romântica assim é a mesma de cabelos pretos presos e camisa branca amarrada na cintura do vídeo, que como o preto no branco, viu em seu par o melhor do seu romance sob a sky full of stars. É, o mundo anda tão desacreditado que falar de amor soa tão piegas quanto uma flor no punho das garotas acompanhadas. Mas, se conseguir sobreviver ao vídeo inteiro, chegar ao final das palavras e concluir que foi uma carta de amor ridiculamente piegas... é, talvez tenha razão. Talvez o Fernando Pessoa também esteja certo ao pensar que apenas os que nunca escreveram uma carta de amor é que são de fato ridículos. Talvez o amor seja não ter medo de parecer ridículo. Talvez seja sentir-se feliz apenas porque há, em um céu cheio de pessoas iluminadas, uma para quem fazer pedidos especiais e outra para quem escrever cartas de amor. Amores ridículos parecem não estar em moda nos tempos de hoje. Mas, como já disse, eu gosto de contrariar.




04 junho 2016

A Lua não me traiu!


E

u nunca fui de ler horóscopo. Sempre achei um rótulo muito estereotipado. “Libriano, libriana, cuidado com o excesso de trabalho. Hoje você terá uma grande surpresa no amor. Cor da sorte: lilás.” Como assim todas as pessoas de libra estão trabalhando demais e terão surpresas amorosas no mesmo dia? Vão sair todos de lilás nesse dia? Não, não dá.

Hoje continuo não lendo horóscopo e entendo bem pouco do assunto, aliás, quase nada – inclusive, os entendedores que me perdoem, caso eu fale alguma bobagem. Mas, numa das minhas idas à praia como de costume, acabei num barzinho diferente do que normalmente frequento. E todas as vezes que eu fui nesse lugar (eu disse todas), tive uma experiência bastante curiosa que vai desde um papo bem agregador sobre relacionamentos abertos até uma reunião mística de meninas na areia com direito a topless e garrafa misteriosa. Deve ser a energia do lugar, só pode.

Pois bem, numa dessas vezes, conheci algumas meninas que entendem bem de signo solar, ascendentes, lua, vênus, marte e outros termos astrológicos. Entendem tão bem a ponto de ser uma informação bem preciosa o signo do cara que se está conhecendo na balada. Eu, por exemplo, não saberia o que fazer com essa informação. Elas sabem predizer mais ou menos a personalidade das pessoas a partir disso, do mesmo jeito que o meu pai consegue discorrer a personalidade das pessoas a partir de fotos e grafias. No mínimo, bastante curioso.

Obviamente, eu quis saber o que os astros diziam sobre minha personalidade. A única informação que eu, principiante, sabia era meu signo solar. Disseram que a principal característica do canceriano é ser muito emotivo e dramático. Putz! Tinha coisinha melhor não para ser? Logo eu que sempre me achei bem ponderada? Ou eu não conheço nada de mim mesma – o que não deixa de ser uma possibilidade – ou essa parada de signo não tem nada a ver, como eu sempre achei. Das duas, uma. Mas, logo acrescentaram que o signo solar era muito pouco para se definir. Era preciso saber a posição de outros astros e isso dependia do horário em que nasci.

Assim que voltei, procurei a certidão de nascimento, entrei no site indicado e digitei lá: 02/07/1988 às 06h15min. Resultado: Câncer com o ascendente em Câncer. Não, alguma coisa deu errado, claro! Será que calcularam os anos bissextos? Como assim ser duplamente canceriana??? Emotiva em dobro, dramática em dobro, sentimental em dobro, fantasiosa em dobro. Tem condição de ser uma pessoa dessas? Não, definitivamente não tem. Mas, sim, de acordo com os astros, eu sou câncer com ascendente em câncer, queira eu ou não.

Ainda que bem desiludida e desanimada com os astros, já cantarolando: “quando o segundo sol chegar para realinhar as órbitas dos planetas...”, continuei a explorar o resultado e vi que no momento em que nasci, a lua estava em Aquário. Lá vai eu procurar saber como são as pessoas de lua em aquário. Seria, porventura, mais uma característica a triplicar o meu suposto sentimentalismo? "Não, eu não suportaria!" - disse eu, já ensaiando e sendo tomada pelo do ar de dramaticidade que me é atribuído.

“Lua em aquário prefere preservar-se emocionalmente e lida melhor com situações em que tenha liberdade de pensamento e expressão. Sente-se bastante desconfortável com rotinas excessivas, monotonia, padrões pré-estabelecidos e relações afetivas opressoras ou dramáticas.


Yes!!!! Finalmente alguma coerência dos astros, algum realinhamento das órbitas. Isso talvez explique eu ter passado meia hora rindo sozinha da criança de aquário do vídeo. É, Joelma do Calypso, a Lua não me traiu! E agora se alguém, despretensiosamente, perguntar qual o meu signo, a minha resposta será a mais completa possível, dentro do meu singelo conhecimento: Câncer com ascendente em Câncer, mas - don’t worry! - a Lua é em Aquário! Porque a primeira oração é bem constrangedora para ser simples e a segunda é importante demais para ser omitida... vai que a pessoa entende e acredita nessas coisas, né? Nunca se sabe.

02 junho 2016

Mas e Se...?

As coisas são do jeito que elas devem ser. Não há motivos para lamentar um Se qualquer. Não haveria outro jeito de se viver isso, não dentro da nossa realidade. Esse Se, que remete à dúvida, incompletude, lamento etc... “Ah! Mas Se ele...” Não, não quero ouvir. E nem vou carregar essa mágoa do destino de achar que as coisas deveriam ser diferentes, porque sei o que o Se, na sua infinita margem de possibilidades de transformar tantas ideias em possíveis realidades, poderia ser sim bem cruel. Logo, lamentar por uma realidade inexistente iria eu não ficar feliz pelo que tenho? Fico feliz sim, fico feliz pelo encontro.

Há quem não entenda o que acontece e que vive a se perguntar: qual é a real ali? Olhe... confesso que passei muito tempo me fazendo a mesma pergunta, questionando inclusive que espaço da minha vida você poderia ocupar, ao ponto de me causar certo incômodo do quanto tem se tornado importante. Mas pra explicar a quem se pergunta e pra me consolar eu vou me apropriar de uma a frase de Montaigne: "Porque era ele, porque era eu..” Mais claro, simples e completo, impossível.


Hoje me atrevo a afirmar que existe amor, não do jeito que as pessoas esperam e nem no formato de uma paixão fulminante. De algum jeito é amor. Um pouco longe de ser uma história tipo Emma e Dex, eu gosto de comparar um pouco com eles, mas só até aquela cena do telhado (risos). Gosto da inexplicável conexão que existe entre esses dois amigos.

Talvez as coisas mudem muito agora, ou não. “Mas e Se agora...” shiiii... Deixa, eu não quero ouvir. Talvez eu chore as pitangas e ouça meia dúzia de músicas, aquelas que eu gosto de ouvir para fazer tudo parecer mais dramático. Talvez as coisas continuem do jeito que sempre foram ou até melhorem, as possibilidades do Se vão se configurar realidade na hora certa, só sei que hoje o mundo está exatamente onde ele deveria estar. Por hora, o que eu posso dizer é só o que desejo agora: “Seja feliz onde quer que fores, mas se por acaso não possa me levar pela mão, me leve no seu coração e se por acaso não possa no seu coração me levar, me leve no seu lembrar.” (sim, eu parafraseei Ferreira Gullar bem feio kkkkk).


Filme: Um dia (2011), Direção: Lone Scherfig.




19 abril 2016

Valor-es


P

ior do que a perua de fato é a perua emergente. Já é difícil eu conversar sobre marcas e outras tantas futilidades que imperam no mundo delas, mas em se tratando daquelas que entraram nesse mundinho na última chamada, a coisa fica ainda mais sacrificante. As peruas emergentes, em sua maioria, alcançaram esse posto ao se casar com um cara bem de vida. Não querendo rotular, mas já. Não trabalham, seja por opção ou não. E já dizia a minha mãe: as pessoas que não trabalham não sabem o valor das coisas importantes da vida.

A rotina exaustiva que as acompanha é preenchida por compras, salão de beleza, chá das cinco e, por fim, um yoga para relaxar. É, bastante exaustiva mesmo, sem qualquer tom irônico! Fico cansada só de me imaginar passando mais que uma hora no salão. Mas, o que de mais marcante as acompanha cotidianamente é a terrível lembrança de um passado não rico. E, exatamente por isso, elas apresentam uma aversão bem característica a qualquer coisa que recorde de longe o passado que não pode de modo algum ser revelado.

Elas não suportam a ideia de estarem com pessoas de menor renda, muito menos de serem confundidas com uma delas. Agora elas são ricas e que fique bem claro isso. Julgam pobre a maioria dos hábitos que aprenderam quando criança, muitas vezes ensinado pelos seus próprios pais. Não gostam de centro das cidades cheio de lojas populares e pessoas diversas, nem que seja apenas pra comprar um prendedor de cabelo. Elas não gostam de se misturar. A palavra “promoção” deixou de existir no seu estreito vocabulário. Elas têm prazer em não apenas pagar mais caro, mas espalhar isso pra todos.

E, como transmitimos aos outros apenas aquilo que nós temos, a herança deixada por elas a respeito da definição de valor é um tanto distorcida. Quais as chances que seus bebês, vestidos como mini-adultos, têm de não enxergar a vida futuramente por esse ângulo fechado? É um ciclo vicioso, no qual a gente vibra ansiosamente por uma criança rebelde que resista a ele. Ostentar riqueza parece que virou moda. Uma pena! Bom mesmo seria se se mantivesse em moda permanente a riqueza da alma e os valores da vida, frequentemente repetidos na minha infância, como se só se pudesse tornar adulto depois de isso estar bem claro. Que sorte a minha!


04 abril 2016

Os (nós) do acaso que ficam.







H
á pessoas que apenas passam por nós na vida. Passam sem que deixem qualquer rastro, seja ele bom ou ruim. Elas não te fazem mal, também não te fazem bem. São pessoas outono, mornas com folhas secas. Às vezes, nem é uma passada rápida assim. É uma estação inteira de tão longa que é a parada. Mas, nada especial ligavam os trilhos de suas vidas. E quando o trem delas parte... quase não se nota a saída, quase não se ouve o barulho do apito, quase não se sente a mudança do tempo.

Há outras pessoas que a gente gosta. Gosta e não sabe explicar o porquê. Elas são primavera, são verão. Germinam, iluminam. Elas te fazem bem, até quando não estão tão perto assim, apenas por se saber que elas existem ali. Elas também são inverno. Às vezes, elas te fazem mal... às vezes. As pessoas nem sempre acertam e isso não diminui o valor que elas têm. Elas nos mostram algumas coisas importantes da vida, mesmo que não tenham a menor ideia disso. Ocupam um lugar paralelo, uma cadeira reservada. Elas compartilham gostos, sons, cheiros. E quando se pensa nelas, logo aparece um sorriso estampado no rosto.

Mas, às vezes, elas não podem ficar por perto todo o tempo. Elas também precisam ir – quem sabe, ser a estação de outras pessoas.  E a gente, num momento egoísta, não entende bem o porquê de elas precisarem ir. Pra que ser o outono de outro? Não poderiam trazer novos gostos, sons, cheiros aqui? E quando o trem delas parte... vê-se a vida em câmera lenta. Sente as batidas do coração apertado. Escuta palavras de despedida, doces e duras, ao mesmo tempo. Mudaram as estações e o tempo se encarrega de desatar os nós curtos.

Uma amiga – que ainda não precisou ir, felizmente - falava frequentemente como o tempo só nos faz lembrar as coisas boas. Parece ser verdade. Devem ser os nós longos os das coisas boas, os que não se desatam fácil. E isso não importa o tempo que tenham durado. Pode ter sido por três estações inteiras ou pode ter sido só num belo fim de tarde. Não importa. Elas - essas pessoas - permanecem em nós por toda a vida. E sempre irá lembrar-se delas com os felizes acasos: ao escutar uma música, quando ler um trecho de um livro comum, ao assistir a uma cena de um filme qualquer. Vai lembrar até quando, às vezes, esforçar-se fortemente para não lembrar... Não, não é por mal, é que desatar nós deixa a corda marcada, um pouco dolorida.

Não sou muito boa em me despedir das pessoas com as quais eu me importo – já disse isso aqui. Mas, gosto de pensar que quando isso precisa me acontecer, eu tenho coragem de deixá-las ir (elas precisam disso), de permitir que os nós curtos se desatem. E também tenho coragem de atar bem os nós longos, os bons (eu preciso disso). Outras estações virão e enlaçar fortemente os nós longos  ajuda a manter o doce sorriso nos lábios que os felizes acasos trazem junto às lembranças delas - aquelas pessoas que nos importam na vida. As outras, realmente tanto faz.


De outubro/2015.