06 agosto 2010

Entre o mistério e o conforto

Há quem diga que “a paixão é o risco advindo do mistério do outro, enquanto que a intimidade é o conforto que a transparência oferece”. Que pensamento incrível! Não tinha, até agora, visto por esse ângulo. Poderia, então, existir um risco confortável? Um conforto arriscado? Ou ainda, um mistério transparente? Parece um tanto confusa essa coexistência, como se fossem dois corpos diferentes obedecendo às leis da física.

Pensa-se logo numa evolução: quando todos os mistérios já foram desvendados e tiver passado, diante do desconhecido, toda aquela euforia e curiosidade iniciais (Bem fascinantes, diga-se de passagem!), eis que vem a calmaria. O distante se torna próximo, os segredos se tornam claros. E o novo já não é tão novo assim. As atitudes e os pensamentos já conseguem ser quase previstos, afinal se conhece o suficientemente bem para isso. Deu-se lugar à segurança, à certeza, ao conforto. E como é bom sentir-se assim! Íntimos, confidentes, cúmplices. É tão bom que nem se percebe quando o conforto vira comodismo, quando a intimidade invadiu a individualidade. Conheceu tanto que não há mais o que se descobrir e deixou-se conhecer a tal ponto que não sobrou espaço para surpreender, para ser surpreendido. E assim, perde-se o interesse, perde-se a emoção.

Se o mistério é fascinante, a intimidade é confortável e a ideal coexistência entre eles seja de difícil execução, então que, ao menos, um não venha se apropriar definitivamente do lugar do outro. Defendo a livre alternância: oras misterioso, oras transparente; umas vezes íntimo, outras apaixonante. Prefiro a arte de redescobrir o outro todo dia, de redescobrir-se todo dia. E quando se pensar que já conhece bem, que seja instigado a encontrar algo novo. Porque ninguém é estático. Quando se achar que reconhece todos os “eus” existentes dentro de si mesmo, que surja mais um... só pra contrariar. Só pra que você mesmo se surpreenda e possa, de fato, renovar-se para os outros.

Mas se, ainda assim, insistir em questionar: o mistério ou o conforto? ... Confesso uma leve inclinação pelo primeiro... gosto de correr riscos.