15 agosto 2011

As gangorras.



Penso na minha infância mais do que de costume. Adorava parquinhos. Aqueles que tinham casinha na árvore, roda-roda, escorregador. Estava pra nascer alguém que chegasse mais alto do que eu no balanço. A gangorra, embora não fosse o meu preferido, era um local bem divertido para se fazer amizade com quem sentava na outra ponta. É impressionante a facilidade com que as crianças têm de se relacionar. Mas, apenas compreendi o importante papel das gangorras nos relacionamentos quando não mais brincava em parques.

Certo dia, meu pai – o biológico, querido leitor – me disse que os relacionamentos funcionam como as gangorras. Que engraçado! Na época, eu era bem experiente com as gangorras, mas quase nada com os relacionamentos. Sabia bem que não dava para brincar na gangorra sozinha... E foi assim que ele começou: Relacionar-se exige, além de você, mais uma pessoa, cada uma sentada em uma ponta.

Estar na ponta mais alta é encantador. As pernas, balançando sem alcançar o chão, dão a sensação de liberdade, de leveza. O vento parece chegar mais fácil no seu rosto. Os problemas parecem não te alcançar. É bastante cômodo. Afinal, o esforço não está do seu lado. A você, cabe apenas aproveitar o momento. Relaxar. Apreciar. Desse lado, você enxerga tudo de cima. A paisagem, a vida, as pessoas. Inclusive a pessoa que está na outra ponta. Aquela com quem você está se relacionando, lembra-se? E para o seu ego chegar tão alto quanto a distância dos seus pés ao chão não é muito difícil, não falta muito. É apenas uma questão de um pouco mais de tempo nessa posição.

Estar do outro lado e colocar o outro lá em cima não é fácil. É preciso ser uma pessoa de peso, de força. É assumir toda a carga. É abrir mão do seu próprio querer em estar lá na parte mais alta em benefício do outro. É conceder, doar, valorizar. E você fica ali, embaixo, vendo tudo acima de você, inclusive a pessoa com quem está se relacionando. Vê-la tranquila e feliz, naquele momento, é recompensador. Vê-la egoísta e arrogante é decepcionante.

Os relacionamentos baseados na sobrecarga de um sempre em favor do outro tendem à queda. É como duas pessoas com pesos bem diferentes brincando na gangorra. O magrinho fica lá em cima sempre. No início, é divertido, mas não conseguir descer torna a brincadeira chata. Já o gordinho só de sentar, desce e não consegue subir. É outra tortura. Se o que está lá em cima começa a ser prepotente e a esnobar quem está lá embaixo, este sai da gangorra bem rápido, só para aquele, em vez de descer tranquilamente, cair de vez no chão.

Isso porque a graça da gangorra é oscilar a altura. Subir e descer. E, logo em seguida, descer e subir. E qualquer alteração na ordem das palavras altera o produto. Não faz bem para nenhuma das partes quando um faz tudo pelo o outro sempre. A chance de ele achar que está literalmente por cima de tudo e todos é muito grande. Assim como também é grande a chance de você se sentir menos importante. É preciso que o outro se doe também. E veja bem, não se engane achando que, então, o ideal é o equilíbrio entre os dois, entre as pontas. Já se viu brincar de gangorra sem subir ou descer? O equilíbrio é um relacionamento fadado ao comodismo, sem interesses mútuos. É quando um não demonstra querer bem ao outro a ponto de fazê-lo subir, enquanto você mesmo desce, e vice-versa.

As oscilações entre as pontas são divertidas e necessárias. Permanecer estático por muito tempo, independente da posição, é o real problema do jogo, das gangorras e dos relacionamentos.

7 comentários:

  1. Seus textos são sempre ótimos, é incrível como vc explora as coisas simples e faz metáforas incríveis, e gosto também como explora a infância, sempre dá saudade dela kkkk
    bjo

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  2. Já diz Rubem Alves: "O escritor não é alguém que vê as coisas que ninguém mais vê. Ele apenas busca iluminar aquilo que alguns veem sem se dar conta"... E você, Mila, com certeza tem toda uma iluminação especial para inúmeros assuntos, inclusive aqueles detalhes que o coração atenta. Estou visitando costantemente o seu blog em busca de uma nova postagem. =D

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  3. Amor!!!
    Se a gnt for brincar de gangorra não vale...vc só vai ficar por cima! Eu gordinho e vc magrinha! kkkk
    Mas nós consguimos variar bastante e isso é o importante!
    Te amo! bju

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  4. kkkkkkkkkkkk Queria "curtir" o comentário de Celo!

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  5. Esse texto me lembra muito muito muitooo nossa infancia, nossas conversas na madrugada, nossas trocas de informações sobre as nossas balanças. SEMPRE lembro delas quando o assunto eh relacionamento, ensinamento de Caarlinha Ju levo sempre na memória! :) Amoo muuitooo!! Ah..Queria "curtir" o comentario de Celo![2] Carlinha tem um fofo..kkkkkkkkk..

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  6. Celo, ainda há uma esperança de nos divertirmos na gangorra: No post seguinte, é quase um consenso! Eu sou uma Falsa Magra! kkkkk

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  7. adoro a forma que você coloca as coisas do cotidiano. #leitoraassídua bjo

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